quinta-feira, 1 de outubro de 2009

O desafio da fidelidade




Por: Júlio Paulo Zabatieiro

A forma predominante da religiosidade pós-moderna é a da peregrinação.
A religião é vista pelas pessoas como um meio para conseguir resolver os problemas que a ciência, a técnica e a política não conseguem resolver. As necessidades de saúde física, saúde emocional, amor e companheirismo n.o s.o supridas adequadamente na sociedade pós-moderna. Por isso, as pessoas buscam religiões que satisfaçam essas necessidades.
Entretanto, como somente Jesus Cristo pode satisfazer plenamente as necessidades humanas – e transformar o nosso ser interior – a pessoa sedenta busca resposta nas várias religiões
que se apresentam no “mercado de bens simbólicos” – dê uma passeadinha pelo caminho de São Tiago, toma um chazinho do Santo Daime, vai pedir a bênção da Madre Tereza, ou do Pai João, entrega um dinheirinho na Universal, pega uma aguinha benta na Catedral. A religiosidade pós-moderna não sabe o que é fidelidade, a não ser a fidelidade ao interesse próprio, que pode ser chamada de egoísmo.

A pregação do Deus dinheiro e a vida sacrificial
A outra face da religiosidade pós-moderna não tem “cara” de religião. Por isso mesmo, é muito mais perigosa, porque muitos não a reconhecem. A religiosidade pós-moderna tem como seu grande “deus” o dinheiro – seja na forma de Capital, seja na forma de lucro, seja na forma de desejo dele – que cobra uma séria e rigorosa sacrificial de vida. Para que as economias funcionem bem, os países exigem “sacrifícios” de seus cidadãos (desemprego, apertar os cintos, corte de gastos com saúde, educação, transporte, moradia; privatizações sem fim), e na expectativa de ter dinheiro para poder consumir, as pessoas se submetem ao estilo de vida sacrificial exigido pelo Mercado. Nesse estilo de vida sacrificial, a compaixão e a solidariedade não têm lugar.

O desafio do discernimento
A vida não refletida, apenas sentida é uma das características fundamentais da chamada pós-modernidade é o abandono da reflexão crítica racional. Reconhecendo a incapacidade da razão de resolver todos os problemas humanos, as pessoas que aderem ao novo modo de ser pós-moderno preferem levar a vida a partir dos sentimentos e desejos, e não da reflexão, ou, em linguagem bíblica, do discernimento. Sentir é mais importante do que saber, e sentir-se bem é o que realmente importa para o indivíduo pós-moderno. Essa ausência de reflexão é conseqüência da negação das utopias (propostas de transformação social e econômica) e da afirmação do “fim da história” (a crença de que o estágio atual do capitalismo neoliberal é a forma mais completa da evolução  humana).

A vida sem integridade, apenas com interesses e desejos
Uma vida vivida em função dos sentimentos, além de negar a capacidade humana de crítica e pensamento construtivo, também nos torna fáceis presas de nossos interesses e desejos pecaminosos. Vários são os sintomas da crise da razão e do reinado do sentimentalismo. Por exemplo: a desestruturação da vida familiar, em função de uma visão meramente romântica do amor, mediante a qual “João ama Maria, que gosta de José, que ama Antônia, que prefere Pedro, mas está triste porque ele ama José”. Outra causa da desestruturação familiar é o afastamento cada vez maior entre pais e filhos, a falta de comunicação eficaz entre as gerações dentro de casa, a tentativa de cada lado impor a sua vontade e seus desejos. Além da desestruturação da vida familiar, outro exemplo da crise da razão é o abandono da integridade como padrão típico de comportamento.

A vida cheia do Espírito Santo, refletindo e crescendo no saber de Deus.
Contra o irracionalismo da pós-modernidade, a resposta bíblica. A vida cheia do Espírito Santo. (Ef 5,15-18). A exortação paulina é muito apropriada para os nossos dias. Precisamos de uma renovação da vida intelectual da Igreja. Precisamos de que o povo de Deus assuma a sua função de teólogos e teólogas! Pois é isso que Paulo está pedindo de nós. Estar atentos a nosso modo de viver, sermos sensatos, significa refletirmos sobre a nossa realidade à Luz da Palavra de Deus, movidos pelo Espírito. E a teologia é exatamente isso! Na modernidade, a teologia era rejeitada em troca da “prática”, na pós-modernidade ela é rejeitada em troca da “beleza”.

Vivendo em uma sociedade e economia sem compaixão
A sociedade capitalista neoliberal pós-moderna é perversa e sem compaixão. Nela só há lugar para as pessoas capazes e competentes, que conseguem cumprir todas as exigências do mercado de trabalho e de consumo. Cada vez mais as empresas exigem maior qualificação para seus trabalhadores, e cada vez mais as máquinas substituem as pessoas no desempenho de funções e realização de serviços – e com isso aumenta o desemprego, a economia informal e a marginalidade. A chamada “globalização” da economia traz consigo uma perversa globalização da miséria e do sofrimento humano. Sê tem valor aquilo que dê lucro, aquilo que aumenta a produtividade e a qualidade, aquilo que é “total”. Nessa sociedade “qualidade total” pouco lugar há para os seres humanos, que são parciais, incompletos, pecadores. Recusados, ou elogiados, pelo “deus escondido”, as pessoas cada vez mais se refugiam nas drogas, na violência, nas religiões sem compromisso, no sexo sem amor, no individualismo, no consumismo; ou simplesmente caem para o submundo da miséria, da fome da marginalidade. É a todas essas pessoas que iremos pregar o Evangelho, pessoas sacrificadas ao altar do Capital, submissas ao mando do seu profeta, o Mercado!

Compaixão e solidariedade na proclamação do Evangelho
Precisamos de compaixão e solidariedade para proclamar o Evangelho! Ao olhar
para as pessoas e para as multidões de seus dias, Jesus as via como “ovelhas sem pastor” e demonstrava-lhes compaixão. A compaixão (solidariedade) era o motor de suas ações a favor das pessoas (v. Mt 9,36; 14,14; 15,32; 20,34; Mc 6,34; 8,2; Lc 7,13, etc.). Jesus demonstrava, através de seus atos, a compaixão de Deus pelos seus filhos e filhas escravizados ao pecado; demonstrava a solidariedade do Deus encarnado para com a humanidade pecadora (cf. Hb 2,14-17; 4,15-16).

Compaixão e solidariedade na diaconia cristã
Assim como Jesus fez acompanhar sua pregação de sinais visíveis do amor de Deus pelos pecadores, também a Igreja compassiva, na pós-modernidade, faz sua pregação da salvação ser acompanhada dos sinais do Reino. Quem ama, é compassivo e solidário com a pessoa toda, n.o faz divisão entre “alma” e “corpo”, pregando para salvar “a alma” e deixar o “corpo” morrer. Jesus cuidava das doenças do corpo, das doenças espirituais, dos problemas econômicos e sociais.

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